Jesualdo Cavalcanti: escritor e membro da APL |
Para quem não sabe, “patrimônio de bacharéis” foi a expressão cunhada por Francisco Xavier de Mendonça Furtado, governador e capitão-general do Grão-Pará e Maranhão, em carta ao marquês de Pombal, seu irmão, para caracterizar os sertões do Piauí diante das costumeiras e intermináveis escaramuças judiciais geradas pela concessão indiscriminada de terras, sob a forma de sesmarias. Envolviam disputas entre sesmeiros, posseiros e jesuítas, sob a batuta de advogados e ouvidores". .
Para Xavier, como os bacharéis se julgavam donos do Piauí, haveria “de custar a Sua Majestade muito a desapossá-los.” Aliás, a miragem do bacharelismo sempre embalou os sonhos dos piauienses. Em 1822, enquanto o governo não se mostrava capaz de manter sequer uma sala de aulas de primeiras letras, cuidava de criar aulas de gramática latina, conforme carta estampada na capa da obra.
Nessa obra, fruto de cuidadosas e variadas pesquisas, tento resgatar a memória de 130 anos do exercício do poder no Piauí, período que compreende desde a instalação da capitania (1759) até a Proclamação da República (1889). Na garimpagem empreendida, foi possível saber, contrariando nossos principais historiadores, que João Pereira Caldas, nosso primeiro governador, instalara a capitania e assumira o poder aos 23 anos de idade, e não aos 35 ou 39 anos. O bacharel João José de Oliveira Junqueira Júnior, por sua vez, responsável maior pela implantação da navegação a vapor no rio Parnaíba, o faria aos 25 anos. Ambos mais novos que o conselheiro Saraiva, o fundador de Teresina, antes apontado, com seus 27 anos, como o mais jovem de nossos governantes ao tomar posse.
Sede da Academia Piauiense de Letras (APL), em Teresina |
Ao tempo em que aqui aportavam aqueles forâneos, muitos bacharéis piauienses eram mandados a emprestar o brilho de seu talento e competência noutras províncias. Citam-se, dentre eles: Francisco de Sousa Martins, que presidiu as da Bahia e Ceará; Francisco José Furtado, a do Amazonas; Polidoro César Burlamaqui, a do Paraná; João Lustosa da Cunha Paranaguá, o famoso marquês de Paranaguá, as do Maranhão, Pernambuco e Bahia; Eliseu de Sousa Martins, as do Rio Grande do Norte e Espírito Santo; José Basson de Miranda Osório, a da Paraíba; José Manuel de Freitas, as do Maranhão e Pernambuco. Furtado e Paranaguá foram além: ocuparam vários ministérios e presidiram o Conselho de Ministros.
A obra relaciona os piauienses formados, à época, em academias europeias e brasileiras, bem como aqueles que, exibindo esse galardão, exerceram cargos executivos, legislativos e judiciários. No fim, uma conclusão paradoxal: pena que a tentativa de barramento das oligarquias que o Império tentou fazer com a caneta, a República não tenha sido capaz de prosseguir com o voto popular, pois surtos oligárquicos logo começariam a vicejar no novo regime.
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