quinta-feira, 1 de setembro de 2011

As impropriedades da campanha "Piauí Unido, Feliz por inteiro"

Zeferino Jr: "A discussão começa a me entediar"
Em artigo publicado no Jornal Diário do Povo, dia 26 de agosto de 2011, o servidor público Zeferino Júnior faz uma análise sobre o posicionamento dos divisionistas e dos que são radicalmente contra a divisão territorial do Piauí. A presente matéria está postada também no site do CEDEG – Centro de Estudos e Debates do Gurgueia (www.gurgueia.org.br/):

“Já consignei em alguns textos, publicados nos jornais locais, considerações sobre a divisão do Estado do Piauí. Apontei questões que reputei importantes nessa discussão que tanto alimenta os ânimos políticos, populares e intelectuais do Estado.

Alguns questionamentos de ordem política – muitos dos que encabeçam essa idéia fez parte de um modelo político que contribuiu para a miséria no Estado, isso é fato – e outros, com base na lógica que permeia o discurso dos divisionistas – se a divisão não traz prejuízos, mas ganhos para todos os entes políticos envolvidos, teríamos encontrado a fórmula mágica para todo o problema da miséria no país – formaram o eixo dos meus argumentos.

Abri mão de discutir as questões econômicas envolvidas por ignorância, uma vez que, para discuti-las, é necessário ter um mínimo de conhecimento de economia e gastos públicos.
Sempre atento à movimentação dessa idéia, acompanhei, recentemente, o manifesto dos não-divisionistas, encabeçado por alguns políticos, intelectuais e artistas defensores do, como é mesmo?, “Piauí Unido e Feliz”.

Embora não tenha ido ao encontro, pincei alguns discursos proferidos pela tevê de alguns dos ideólogos da “união pela felicidade”. Merlong Solano, deputado estadual, foi enfático: “vai haver um abalo na questão cultural do nosso povo, com essa divisão”.

Claudete Dias, renomada historiadora, apontou a questão da identidade cultural como um dos empecilhos, uma vez que não formamos, ainda, a nossa e já vem uma divisão político-administrativa. “Como fica a minha identidade?”, indagou ela, desalentosamente.

Nazareno Fontelles, deputado federal, trouxe à tona a velha discussão sobre as elites políticas, como obstáculo para a criação de uma nova estrutura para o novo ente.

Lázaro do Piauí, músico, preocupou-se com o seu sobrenome artístico, afinal, ao dividir o Estado, na cabeça dele, a sua “marca” – sobrenome “Piauí” – seria reduzida!? O seu distintivo perder-se-ia diante da cisão. Meu Deus!

Na minha colossal ignorância, incrementada pelo meu desconhecimento não menos abissal sobre cultura e política, fiquei com meus botões a refletir sobre esses posicionamentos.

Não consegui vislumbrar o abalo na cultura do nosso povo, vocalizado por Merlong. Pelo que eu sei, cultura é um bem que transcende fronteiras administrativas e políticas. Não se esquadrinha. Não sofre limitações por conta de uma decisão político-administrativa que tem por fim delimitar áreas e atuação de governo. 


Cultura não sofre limitações por causa de uma decisão política
Cultura não “precisa” de território, embora sofra influência dele. Está incrustada no falar, no agir, no ser. Portanto, piauienses da gema, ao “abrir” mão de parte de seu território, vocês não estariam abrindo mão de seu patrimônio cultural.

Se o Piauí deixasse de existir, hoje, ainda assim não existiria uma liga, um liame que uniria e robusteceria a tal “piauiensidade”, tão cantada e exaltada.

Quanto à identidade cultural, como bem disse a historiadora, não temos ainda nenhuma definida. Se não temos – pode-se contestar isso –, não há o que se perder. E, convenhamos, antes da identidade, vem a dignidade, vem a sobrevivência, só obtidas com medidas políticas efetivas que possibilitem o acesso aos bens básicos para sobrevivência.

Quanto à elite política, ávida pelos cargos e benesses do novo ente, a crítica é pertinente, mas com todo e admiração que nutro pelo Deputado Nazareno Fontelles, não pode ser feita, sem uma imensa autocrítica, do político que faz parte de um partido que se aliou escancaradamente ao velho coronelato mais viciado de nossa triste história republicana. Só um exemplo rápido: o apoio do PT do Maranhão aos Sarneys, imposto por Lula.

Quanto ao “Piauí” do Lázaro, não há riscos. O divulgador-mor da “piauiensidade” não deve se apoquentar. O seu nome será preservado, com ou sem divisão. Os possíveis gurgueienses não exigirão a retirada do seu sobrenome para curti-lo, para apreciar os seus forrós. Quem sabe, aí seria uma grande homenagem, não haveria uma campanha para aumentar o seu nome: Lázaro do Piauí e do Gurguéia. Perderia o apelo promocional, pela extensão do patronímico, mas emprestaria ao artista uma identidade maior, mais larga e menos paroquial.

Pois bem. Trago essas considerações não para desestimular os contrários à divisão, e muito menos, para hipotecar o apoio incondicional aos divisionistas. Não, absolutamente. Na verdade, a idéia é só pinçar algumas incongruências que considero importantes nessa discussão acalorada. Na hora do embate, é preciso se preocupar com a contra-ideia, com os contra-argumentos.

A discussão é boa, mas, confesso, começa a me entediar. Deixarei para os “entendidos”, conhecedores de fundo de nossas (in)capacidade econômica, das nossas potencialidades turísticas, das nossas identidades históricas (ou da falta delas) na discussão.

Como reles escrevinhador metido, não tenho muito a acrescentar, a não ser algumas impropriedades retóricas deste ou daquele grupo”.

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